(Autoria: Marcia Aparecida Franco, mãe eterna da Bia e do Gu, tia eterna do Kauê)
Essa dor que transcende quando um filho parte…e quando dois filhos partem junto com um sobrinho? Renascer, num gesto diário, lento, cheio de altos e baixos, renascer através de quem eram, como a fala da Marcia, “fazer as coisas que eles gostavam, como se eles vivessem em mim”, “sentir a presença deles no coração o tempo todo”, se agarrar ao amor que fica, às cenas vividas que ninguém roubará , procurá-los no amor que alimenta e jamais deixará de existir, transcenderá, junto com essa dor. Gu, Bia e Kauê deixam os pais, partem mas não foram perdidos, não há como perdê-los, estarão aqui todos os dias da vida de vocês…
“Desde que meus filhos nasceram me tornei a mãe que aprendi a ser com a minha, a mais dedicada, amorosa e generosa, sentíamos um amor tão grande, sei que a maioria das mães sabe do que estou falando, desse amor incondicional, que tudo suporta, sem medidas. Primeiro chegou a Bia, linda a razão da minha vida, depois de 4 anos, o Gustavo, meu sonho sempre foi ter um menino, estava no êxtase da minha felicidade, nada poderia ser mais perfeito, me dedicava 100% a eles, minha família fazia o mesmo, meu irmão era um tio pai, meus pais os melhores avós, o pai deles também sempre os amou muito, mas trabalhava em outra cidade, e não ficava muito presente, mais nunca faltou amor! Foram crescendo assim, com os primos próximos, rodeados de amor, o Kauê era o primo mais querido, era dois anos mais velho que o Gu, não se desgrudavam, as sete da manhã, aos finais de semana, ele já estava no meu portão chamando o Gu para brincar.
Essa vida perfeita, que eu reconhecia, pois nunca reclamei de nada em minhas obrigações de mãe, durou quatorze anos. A Bia era uma menina delicada, amorosa, inteligente, tinha o melhor abraço do mundo, adorava ler e escrever, dizia que seria jornalista e um dia iria morar fora do país, cheia de sonhos, apaixonada pela vida e madura, todos adoravam conversar com ela. O Gu, era o menino mais generoso, amável e bondoso que já conheci, tinha uma empatia tão grande pelas pessoas, as vezes até me sentia preocupada por ele ser assim tão sensível à dor dos outros, tinha um olhar doce. O Kauê era o mais alegre, tinha uma energia que contagiava a todos, cheio de vida, o companheiro do Gu pra tudo.
Quando me separei em 2016, foi uma fase difícil, mas minha maior riqueza estava comigo, meus filhos, até que nas férias de julho de 2017, mesmo sem nunca ter ficado uma só noite sem dormir com meus filhos em casa, achei que naquela última semana de férias as crianças deveriam passar uma semana com o pai, sentiam falta dele, foi uma semana sem meus filhos e, mesmo sabendo que estavam com o pai em outra cidade, foi difícil, me sentia perdida, não sabia fazer outra coisa, exceto ser a mãe deles. Nos falamos todos os dias, o Gu reclamava que queria vir embora logo, a Bia estava adorando, pois amava demais o pai, então, para matar logo a saudade, disse que na sexta feira eu iria até um sítio que temos, e assim ficaria mais perto para o pai trazê-los, assim, nos veríamos mais rápido. O Gu ficou animado e me pediu, “mãe traz o Kauê e o Pedro” um amigo deles, e eu não pude falar não pro meu filho. Na sexta eles chegaram ao sítio, nossa, quanto abraço e beijo, quanta saudade, naquela noite dormi agarrada aos dois, tivemos um fim de semana maravilhoso com sol e piscina, como eles amavam.
Resolvemos sair mais cedo no domingo, logo após o almoço, as aulas começariam na segunda. Quando estávamos retornando, no meio da estrada, vi um pedaço enorme de ferro, me assustei e em uma questão de segundos, perdi o controle do carro. Meu Deus, como eu pude falhar naquele momento? Todos dizem, “foi um acidente”, mas meu coração de mãe se sente culpado por não poder controlar aquilo e proteger minhas crianças, enfim, capotei o carro, e saí ilesa somente com um corte na mão, mas as crianças estavam machucadas, não podia acreditar naquilo. Nos levaram pra um hospital próximo, chegando lá, veio a pior coisa que uma mãe poderia ouvir, o médico disse “morreram dois meninos e a menina”, eu sabia que meus filhos tinham partido, restou somente o Pedro, que estava muito mal, acharam que ele não resistiria também, mas os planos de Deus pra ele eram outros, um milagre aconteceu e ele se salvou, mas perdi meus amores. Parecia loucura, como acreditar naquilo? Como viveria sem eles?
Toda família se despedaçou, se alguém não acredita que existe uma força maior que nos faz suportar, eu não sei, pois não tem como não enlouquecer se não houver algo além das nossas forças, hoje, fazem três anos que vivo sem a razão da minha vida. Fiz muita terapia, tive muitos novos amigos que me ajudaram, quem menos imaginamos se afasta, talvez não por mal, mas não suportam nos encarar. Minha mãe e meu irmão são as pessoas que mais me dão forças, meu irmão afirma todos os dias que esse amor que sentimos um pelo outro é maior que tudo, que essa vida é rápida demais e logo passaremos uma eternidade juntos e, assim, vou vivendo nessa esperança.
Saber o quanto os pais do Kauê sofrem também me traz uma carga muito grande, pois só quem passa sabe a dor de perder um filho, isso me machuca muito. O que mais me doía eram aqueles sonhos, a vida maravilhosa que eles tinham, tudo foi tirado deles, eu e a Bia estávamos preparando sua tão sonhada festa de 15 anos, ela não aconteceu, isso acabava comigo, hoje, depois desse tempo, procuro pensar que eles estão bem, cuidados com o maior amor do mundo, que é o de Deus, só assim consigo continuar
Tento fazer as coisas que eles gostavam, como se eles vivessem em mim, sinto a presença deles no meu coração o tempo todo, isso é o que tenho e me agarro a esse sentimento, às minhas memórias, aos momentos felizes e a todo o amor que vivemos. Não posso me render, sei do amor deles por mim e, como tudo é mistério, procuro não decepcioná-los, como dizem que o luto tem fases, vou passando por elas mas, elas não cessam, vou caindo e me levantando, mas posso falar que o amor é maior que tudo e tenho certeza que é isso que me faz viver, o nosso amor!!! Amor Eterno!”
@marciafranco54