Filho, sou sua Mãe para sempre, isso é irreversível

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Amanda fala dos caminhos do amor e do luto. Gabriel, seu único filho a fez Mãe para Sempre, e isso é irreversível. Gabriel, esse amor que precisa de espaços, tanto amor que ela criou a comunidade “Mães para Sempre”, um dos jeitos de lidar com tanta saudade. Não que seja fácil, “choro? Choro. Sinto saudades? MUITAS, de forma indescritível e imensurável. Não é mais como eu gostaria; é como é, é como dá pra ser.” Seguir, sendo mãe, com todo amor, orgulho e honra que esse filho merece. Continuar, sendo mãe, para sempre.

279883675_10159682567849185_4203893744889338115_n“Estava muito nervosa quando encontrei o médico que o socorreu e perguntei se se ele ficaria com alguma sequela. Ele me respondeu de pronto: “Olha, eu não sei nem se ele vai sobreviver”.

“Faz oito anos que o Gabriel morreu, vítima de atropelamento em uma movimentada rua da Tijuca/ RJ. Havíamos almoçado juntos no Mc Donalds nesse dia, brincamos fazendo planos para as férias e para o retorno às aulas. Ele voltou para casa e eu fui para o trabalho. Tínhamos ingressos comprados para o cinema no final de semana seguinte.

Nunca poderia imaginar que quatro horas depois ele estaria em coma, entre a vida e a morte. Fui avisada assim que o acidente aconteceu e saí correndo para o hospital. Estava muito nervosa quando encontrei o médico que o socorreu e perguntei se se ele ficaria com alguma sequela. Ele me respondeu de pronto: “Olha, eu não sei nem se ele vai sobreviver”. Demorei a processar o que o médico disse e confesso que fiz isso durante todo o período de internação no CTI, que durou quatro dias.

279870005_10159682567819185_8978293719414859673_n“Eu NUNCA imaginei que o Gabriel fosse “mortal”. Mas ele era. Os filhos são. Os seres humanos são. E essa é uma dura e cruel realidade. Não adianta bater na madeira ou evitar o assunto.”

Eu NUNCA imaginei que o Gabriel fosse “mortal”. Mas ele era. Os filhos são. Os seres humanos são. E essa é uma dura e cruel realidade. Não adianta bater na madeira ou evitar o assunto. Meu filho sempre esteve tão sujeito a enfermidades, acidentes e tragédias quanto um velhinho de 90 anos. Ele tinha apenas dezesseis quando precisei lhe dizer adeus. Não tive opção. Estava fora do meu controle.

A realidade é que todo o controle que pensamos ter sobre a vida não passa de uma ilusão. Coisas ruins acontecem com pessoas boas e somos todos finitos. Todos. Aliás, uma das grandes questões da morte é acharmos que nós e as pessoas que amamos somos imortais. Não, não somos. E ter essa consciência da efemeridade e da impermanência nos ajuda a valorizar o que realmente importa nessa existência.

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“Minha maternidade é tão legítima quanto qualquer outra. Quis compartilhar essa descoberta com todas as mães enlutadas do mundo e criei a comunidade Mães Para Sempre.”

O nome do grupo está diretamente relacionado com o meu primeiro Dia das Mães longe do Gabriel. Eu estava de luto há apenas três meses quando me dei conta da data que se aproximava. Como mãe de filho único, bateu um desespero e eu não sabia o que fazer com esse dia. Felizmente, a terapia me ajudou a entender que minha maternidade é tão legítima quanto qualquer outra. Quis compartilhar essa descoberta com todas as mães enlutadas do mundo e criei a comunidade Mães Para Sempre.

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“Choro? Choro. Sinto saudades? MUITAS, de forma indescritível e imensurável. Não é mais como eu gostaria; é como é, é como dá pra ser.”

É claro que a celebração é diferente desde então. Não ganho mais presentes, nem beijos, nem café da manhã na cama. Porém, todos os anos encontro uma forma de me conectar ao meu filho através de algum ritual especial que faça sentido para nós dois. Assisto a um filme da Disney, visto a camiseta que ele mais gostava, saboreio sua sobremesa preferida ou faço uma postagem nas redes sociais. Choro? Choro. Sinto saudades? MUITAS, de forma indescritível e imensurável. Não é mais como eu gostaria; é como é, é como dá pra ser.

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“Ser mãe de um filho morto é mais desafiador do que ser mãe de um filho vivo. Mas não deixa de ser maravilhoso!”

Há 26 anos meu filho me transformou em Mãe, um estado irreversível, e a sua partida e ausência física não fazem de mim uma mãe menos realizada e orgulhosa.

Não foi tarefa fácil, mas, ao longo dos anos, conquistei o respeito da minha família e amigos e deixei claro que ninguém precisa ficar com receio de me parabenizar no Dia das Mães. Passei então a receber flores, mensagens, abraços e reconhecimento nesta data que sempre foi e será tão importante pra mim.

Enfim, tudo isso me obrigou a entender e viver a maternidade de uma forma transcendente e atemporal. Ser mãe de um filho morto é mais desafiador do que ser mãe de um filho vivo. Mas não deixa de ser maravilhoso!

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“Se mil vidas eu tivesse, mil vezes eu escolheria o Gabriel como filho, a despeito da quantidade de tempo que tivemos juntos e do quão difícil isso é.”

Se mil vidas eu tivesse, mil vezes eu escolheria o Gabriel como filho, a despeito da quantidade de tempo que tivemos juntos e do quão difícil isso é. Fechar os olhos e resgatar memórias relacionadas à gestação, ao nascimento e crescimento do meu filhotinho, assim como ao seu jeito autêntico, carinhoso, otimista e leve de ser, faz tudo valer a pena.

E, se eu fui capaz de conseguir viver meu chamado de mãe desta forma, todas as mães podem conseguir pois não sou diferente nem melhor do que ninguém. Que todas nós possamos celebrar o próximo dia 08 de maio, da forma como conseguirmos. E isso vale também para os filhos e filhas que não estarão fisicamente com suas mães no domingo.”

Eu tenho absoluta certeza de que elas amam vocês.
Paz e luz.
Autoria: Amanda Tinoco, Mãe Para Sempre do Gabriel.

Autora no livro:

Revés de um parto: Luto materno (org. Karina Okajima Fukumitsu), Summus

@lacoselutos_
@psi.amandatinoco
@maes.parasempre

2 Comentários

  1. Elizabeth Botelho Nunes Orsini

    Amanda querida,
    Qdo uma mãe sofre com a ausência física de seu filho, todas as mães sofrem juntas. Pode crer ! E eu, muito mais, porque além de conhecê-lo, dividi com o pai de seu filho todo aquele período de angústia e muito sofrimento, enquanto ele lutava pela vida. Mas ele era puro demais e Deus o tomou pra Si.
    Mas seu espírito continua presente, numa dimensão pra nós ainda desconhecida.
    Nesse “Dia das Mães”, que seu menino, seu rapazinho lhe apareça, nem que seja enquanto dorme, num lindo sonho, aliviando um pouquinho a dor de seu coração partido.
    Feliz dia das mães, com muita paz e luz !
    Um grande beijo !
    Elizabeth

    • que mensagem mais linda, Elizabeth! que você tambem tenha seus sonhos povoados por esse amor, muita gratidão!

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