“O dia que mudou minha vida…”

1973

 

As despedidas acontecem sem aviso prévio, você deixa seu amor no aeroporto com a promessa do encontro à noite, “era agora dia 31 de outubro de 1996. Logo pela manhã, o Abu seguiria para o Rio de Janeiro no voo das 8h00, pela empresa aérea TAM e estaria retornando no final daquele mesmo dia.” 

O Abu não retornou para Sandra e os dois filhos pequenos. O amor e a dor foram os ingredientes para que a Sandra fundasse a Abrapavaa (Associação Brasileira de Parentes e Amigos de Vítimas de Acidentes Aéreos), a fim de orientar e dar apoio a familiares de vítimas de acidentes aéreos por todo o Brasil. Após a Fundação foram publicados dois livros, com informações fundamentais para apoiarmos familiares e amigos de vítimas de acidentes aéreos: “O dia que mudou minha vida”, “Acidente Aéreo: o que todo familiar de vítima pode e deve saber”.

A vida segue, ela sai do aeroporto e vai ao dentista, houve um barulho, mas não imagina a dor que a aguarda, ali, a poucos minutos. Segue, os filhos crescem, a neta chega, mas o amor é eterno e a saudade acompanhará esse amor…

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(Autoria: Sandra Assali)

“O Abu era um homem maravilhoso no que se refere a inúmeras virtudes: educado, amigo, carinhoso, extremamente espirituoso, dedicado à família, bem-humorado, muito inteligente, falava cinco idiomas, esforçado. Atuava como médico cardiologista, contava agora com os seus 45 anos, encontrava-se no auge de sua carreira, sentia-se realizado, tinha uma vida profissional intensa que o obrigava a estar ausente em viagens pelo mundo, não só participando de congressos, seminários, palestras, entre tantas de suas atividades.

Nossa família era adorável, estávamos casados há 10 anos, estabilizados, tínhamos nossos filhos, todos com saúde, nossa casa, viagens com as crianças, enfim, tudo aquilo que desejávamos em nossas vidas.

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O DIA DO ACIDENTE
Era agora dia 31 de outubro de 1996. Logo pela manhã, o Abu seguiria para o Rio de Janeiro no voo das 8h00, pela empresa aérea TAM e estaria retornando no final daquele mesmo dia.
Eu havia marcado uma consulta com o dentista para o meu filho, também no horário da manhã, então resolvi levar primeiro o Abu até o Aeroporto de Congonhas, que era muito próximo de nossa casa e de lá seguiria com o nosso filho Samir para o dentista.
Meu marido estava acostumado com a ponte aérea, prática comum no seu dia a dia e acabava sempre chegando momentos antes do embarque. Nesse dia, não havia sido diferente. Assim que o deixei, nos despedimos com um beijo, o Samir fez o mesmo e, confesso, foi uma despedida “rotineira” … Como se fosse “apenas mais uma viagem”, afinal, dentro de poucas horas, estaríamos juntos novamente.
Era o que pensávamos. Era a certeza que tínhamos. Porém, desta vez, não foi assim… Nunca poderia sequer imaginar que aquela despedida no aeroporto seria a última.
Assim que chegamos ao dentista, o Dr. Cassiano, um grande amigo do Abu desde a época da faculdade, recebeu-me e logo comentou:
“– Sandra, você viu o que aconteceu?”
Respondi:
“– Não… O que houve?”
E ele me disse assustado:
“– Acabou de cair um avião próximo ao Aeroporto de Congonhas e explodiu, acho que não existem sobreviventes”. Imaginem… Eu gelei! Fiquei atônita, perdi o equilíbrio, pedi para sentar e então ele me disse:
“– O que foi? Você se assustou, não está passando bem?”
“– É que acabei de deixar o Abu no aeroporto para viajar para o Rio de Janeiro.”
Então o Cassiano me acalmou:
“– Fique calma, o voo que caiu seguia para Brasília”.
Realmente, essa foi à primeira informação dada pela imprensa e, evidentemente, a notícia me impactou e me chocou, afinal, um avião havia acabado de cair, resultando em inúmeras vítimas fatais. No entanto, confesso, me senti um pouco mais tranquila uma vez que “não era o voo do meu marido”. Aliás, sempre pensamos dessa forma em situações semelhantes, que “acontece com os outros, nunca com a gente.”.
Logo que saímos do dentista, entrei no carro e liguei o rádio, não se falava em outra coisa. Como tudo era ainda muito recente, as informações eram desencontradas. Falava-se que havia fogo, destruição, bombeiro, polícia, muita gente, a presença da imprensa com muitos repórteres; eram informações de todas as formas. Quando eu estava bem próxima de casa, escuto no rádio:
“– Uma correção: “– O voo não seguia para Brasília e sim para o Rio de Janeiro”. Foi o momento de certeza da minha perda!
Éramos apaixonados, tínhamos planos, projetos… vivi um luto bastante difícil, complexo e doloroso. Após 2 meses do acidente eu procurei ajuda com psicólogos e terapeutas, para mim e para meus filhos também – Samir, que estava com 7 anos e Rafaela, que estava com 4 anos. Foi essencial, indiscutivelmente eu não teria condições de reagir sozinha. Foram alguns anos para que eu tivesse a certeza de que estávamos bem e que tínhamos o direito de ser felizes.

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O tempo passou… vamos para 25 anos do acidente em outubro próximo, vidas refeitas, filhos criados, formados, com saúde, mas… a saudade… essa será eterna! Sempre nos pegamos lembrando de alguma característica dele… fazemos referências… hoje tenho uma neta, a Laura, de minha filha Rafaela, ela está com 2 anos, falamos do “vovô Abu” para ela… mostramos fotos… hoje, ela mesmo pede para “ver foto do vovô Abu”… memórias… importante mantermos nossa história… mas não por isso, seguirmos com nossas vidas, preservando todo o carinho e amor dos entes queridos que foram importantes em nossas vidas e tanto representaram nossas emoções.

Para maiores informações ou compra dos livros

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