Um pai, uma avó. A música, a sensibilidade, o bordado, a ternura, as comidas, o amor, em tantos espaços. Como dizer que há despedida quando herdamos tantas e tantas coisas de quem amamos. Elaine, nos conta do amor. Amor que é oferecido na vida que está, na vida que vai indo aos poucos, nas desistências, na compreensão que os caminhos de quem amamos não nos pertencem. Elaine nos conta do amor que compreende e aceita.
(Autoria: Ela Canineo)
“Desde muito pequena eu sempre fui um grude com ele, aí, se fosse na esquina e não me levasse era um chororô, sempre. Meu primeiro trabalho foi com ele, aprender a dirigir foi no colo dele.”
Meu Pai, sua humildade, sensibilidade além de…. e seu amor… (era bravo também às vezes rs ). Desde muito pequena eu sempre fui um grude com ele, aí, se fosse na esquina e não me levasse era um chororô, sempre. Meu primeiro trabalho foi com ele, aprender a dirigir foi no colo dele ….aprender a cantar, foi com ele, ficávamos horas eu e meus irmãos. Quando ainda éramos três filhos, cantando e nos gravando, tudo em cassete , como era divertido, gravava tudo além do cantar, inclusive o que ia acontecendo, esquecíamos da gravação e captava todas nossas conversas… que diversão era ouvir essas fitas.
Mais tarde nasceram mais duas irmãzinhas… sempre dizia que a vida era linda, por temor de ver os filhos sofrerem. Ele sempre se preocupava demais pelos filhos e mais por mim, não sei o porquê. O Amor dele, às vezes, ultrapassava os limites, o que o fazia sofrer muito.
Depois, na minha adolescência fomos nos desconectando um pouco, ele, também, começou a beber muito. Tinham muitos momentos de amor, mas também haviam momentos muito tristes por causa da bebida, oque nos afastou muito. Eu não sabia lidar com isso, o seu sofrer me gerava muito sofrer… ele teve depressão após se aposentar. Era muito, muito difícil ver meu Pai sem a vontade imensa de viver.
“Ele está aqui comigo. Em cada célula, em cada olhar, sei que ele está bem e vivo. obrigada pelo exemplo que você me deixou Pai, os bons e os não tão bons assim, obrigada pela experiência de ser sua filha nesse mundo.”
Fui morar fora…ele ficava inconformado e sofria muito, mas nunca deixou de me ajudar nos meus sonhos. Aliás nos sonhos de todos nós… era bem claro o dever dele de nos ver bem e encaminhados, tendo um lar para viver e uma profissão. Como ele trabalhou pra isso! Mas ele foi esquecendo dele mesmo… foi deixando claro que ele já havia cumprido sua missão aqui e que Deus o podia levar, disse, muitas vezes, que não tinha muito mais o que fazer aqui e, assim, foi indo… por anos se entregando um pouquinho ao álcool, ao que a meu ver era algo que ele carregava ali e não queria que fosse remediado.
Apesar de tudo isso sua fé era algo muito forte. Até hoje eu não saio da cama sem rezar a Ave Maria que ele pedia, e amo e tenho Nossa Senhora na fé como ele tinha em todos meus passos. Um dia, de repente, ele partiu… eu pressenti uma semana antes. Fica aquele vazio no ar, um choque que é difícil entender os tantos porquês, algo “borroso” na vista …
Hoje, após sete anos, eu aprendi melhor. O Espiritismo me ajudou muito nessa época. Vejo que a morte de meu Pai era já em vida, nos anos que ele foi resolvendo se entregar à Deus. Não consegui me despedir, não fui a velório e enterro porque perguntei a minha mãe se poderia não ir e ela disse que eu não precisava se não quisesse. Ele está aqui comigo. Em cada célula, em cada olhar, sei que ele está bem e vivo. obrigada pelo exemplo que você me deixou Pai, os bons e os não tão bons assim, obrigada pela experiência de ser sua filha nesse mundo. Obrigada pelo dom que me presenteou de cantar e a sensibilidade que deixou em meu viver. Amo você e sinto e choro de saudades, me desculpe mas, às vezes, eu preciso. (Sua filha , seu xodozinho, Elaine).
“Vó Albertina… o maior exemplo de doçura e fortaleza nessa vida. Devo tanto à você, sua sabedoria, arte nas mãos ao cozinhar, bordar, quanta simplicidade e sabedoria. Falar da senhora é fácil, vó.”
Vó Albertina… o maior exemplo de doçura e fortaleza nessa vida. Ver minha vó brava com a gente é algo que desconheço…sua comida, suas brincadeiras, sua paciência, nossas idas pra fazenda, lampião a gás, banho quente de caneca esquentada no fogão a lenha, a minha infância. Devo tanto à você, sua sabedoria, arte nas mãos ao cozinhar, bordar, quanta simplicidade e sabedoria. Falar da senhora é fácil, vó. Quantas vezes vi as pessoas na rua quererem se aproximar dela por nada, isso era muito especial. A luz que ela trazia quando chegava em qualquer lugar era muito muito forte.
Você sofria vó e não reclamava, sua doçura e amor ao próximo não deixava nem você se queixar quando, às vezes, era preciso. Você deixou de andar, e ainda assim nunca deixou ninguém ao seu redor sofrer pelo seu sofrimento, você não reclamava daquilo. Eu nunca vi uma pessoa tão visitada até o último momento da vida, a casa da minha vó vivia cheia , era impressionante. Aliás sei o porquê, e repito, sua luz era benéfica a todos, o seu sorriso leve, o seu cheirinho, tudo nela era especial.
“Te amo, além desse Universo. Carrego esse sangue árabe no meu ser, Sem palavras, meu Deus, obrigada. E meu sonho, de ainda deitar no seu colo, não morreu, vó!”
Sentar na mesa dela e não comer era difícil, mesmo que você não quisesse comer o que estava ali, ela arrumava algo diferente na geladeira pra te dar… Curtimos bastante passear juntas na velhice, mesmo na cadeira de rodas ela se esforçava pra estar com a gente, mesmo, muitas vezes, querendo estar na casinha dela, sossegada. Como eu amei esses momentos ao seu lado vó, você não era qualquer vó e eu estava fora do país quando você partiu, isso foi fora dos planos, pela pandemia.
Quando eu saí comprei passagem pra regressar breve porque eu sabia que você estava cansando, vó, mas o destino mudou os planos. Você partiu antes e eu entendo o seu cansaço e o cumprimento de sua obra nesse plano, ele foi executado da maneira mais linda possível. Eu pedia a Deus pra você aguentar um pouco mais aqui, para eu chegar em tempo mas, depois, entendi o meu egoísmo, o tempo não é meu. Doeu muito, eu sonhava em deitar uma vez mais no seu colo, eu conhecia esse cheiro de conforto e estava com saudade de seu riso. Ainda estou… sua casa não é a mesma sem você, vó. A vida aqui não é a mesma sem você. Aquele fim de tarde sem ter aonde ir, o café na mesa, faltando… me custa ainda … não vou negar.
Te amo, além desse Universo. Carrego esse sangue árabe no meu ser, eita mulher forte e doce ao mesmo tempo… você conseguiu e eu nunca conheci ninguém nessa vida como você, linda por dentro e por fora, nessa medida. Sem palavras, meu Deus, obrigada. E meu sonho, de ainda deitar no seu colo, não morreu, vó!
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