Erica, Fellipe, o pai. Um amor que se reinventava nos dias difíceis, na fé, nas brincadeiras. O hospital, a segunda casa, por mais estranho que parecesse, e precisava ser leve. Seguem papai, mamãe e a saudade, segue o desejo de manter a memória, segue a força desse filho junto com eles. Segue o desejo de falar de Fellipe, segurando suas mãos no amanhecer e entardecer do coração e dizendo o quanto o ama. Assim é, assim deve ser, assim merece ser, para sempre.
“Aos dois anos e oito meses descobrimos uma Leucemia Linfoide Aguda. Meu mundo caiu, tudo mudou, começamos outra vida, de puros cuidados.”
Me chamo Erica, sou mãe do Fellipe Gabriel, uma criança tranquila, esperta, inteligente e muito saudável. Filho único e planejado, adorava brincar e sempre gostava da minha participação e do papai. Eu sempre gostei de fazer brinquedos manuais e ele adorava participar da criação.
Ele chegou muito calminho, em 2017 e, aos dois anos e oito meses, planejando que fosse à escolinha dali a alguns meses, descobrimos uma Leucemia Linfoide Aguda. Meu mundo caiu, tudo mudou, começamos outra vida, de puros cuidados, atenção redobrada, eu dizia que ele tinha voltado a precisar de cuidados como um recém-nascido.
“Eu sempre tive essa coisa comigo, que poderíamos estar no pior lugar do mundo, mas quem faria o lugar bom seríamos nós.”
A doença foi descoberta bem no início, ele ficou poucos dias internado, teve alta e, depois, seguimos com tratamento de quimioterapia. Fomos orientados a não colocá-lo na escolinha por conta da imunidade.
Seria um tratamento de dois anos até a cura. Eu sempre o acompanhava nos dias de tratamento e meu esposo, também, revezando comigo nas folgas do trabalho.
Nos ciclos em que estava internado, levávamos muitos brinquedos, lápis de cor, desenhos e fazíamos a festa no quarto de hospital. Apesar de parecer estranho, eu dizia que lá se tornara nossa segunda casa, nós dois nos divertíamos muito. Criamos um clima aconchegante, com música, dança e muitas brincadeiras. Isso fazia passar o tempo, eu sempre tive essa coisa comigo, que poderíamos estar no pior lugar do mundo, mas quem faria o lugar bom seríamos nós.
“Tudo progredia bem, estávamos próximos do final do tratamento, porém, a Leucemia sofreu uma mutação, dando sequência a um segundo tipo.”
Ele nunca pediu para sair, voltar para casa e, apesar das limitações de um tratamento, procurei sempre deixar que continuasse a “ser criança”, e acabei voltando a ser criança com ele.
Tudo ocorreu durante a pandemia. Ficávamos sempre isolados num quarto, por conta da imunidade. Foram muitas idas e vindas à capital. Os médicos sempre se mostravam otimistas em relação ao tratamento e nossa fé se mantinha inabalável.
Tudo progredia bem, estávamos próximos do final do tratamento, porém, a Leucemia sofreu uma mutação, dando sequência a um segundo tipo, o que fez com que Fellipe estivesse com dois tipos de Leucemias ativas.
“Nosso mundo desabou mais uma vez, porém, nossa fé continuava inabalável. Meu filho ficou internado, em estado gravíssimo.”
Nosso mundo desabou mais uma vez, porém, nossa fé continuava inabalável. Meu filho ficou internado, em estado gravíssimo. Os médicos me diziam “vamos orar muito, mãe”. Após 52 dias internado, Deus fez mais um de seus milagres, ele teve alta com a doença sob controle. Deus deu mais uma chance de vida para Fellipe, e para nós, foi um recomeço.
Reiniciamos um tratamento mais intenso, com indicação de transplante de medula, logo após a doença ser controlada. Vivemos momentos muito intensos a partir daí, ele se mostrava ainda mais alegre, mais ativo que nunca, mais feliz, o olhar dele tinha um brilho diferente, eu via Deus o tempo todo nos olhos dele. Todos notavam como ele estava feliz, diziam que parecia outra criança, e realmente era, um anjo com um propósito de espalhar amor e alegria entre nós.
“Vivíamos tudo deixando que fluísse naturalmente, sem nos preocuparmos com o amanhã. Jamais passou pela minha cabeça que seus dias de presença física, neste plano, estavam se encerrando.”
Parecia que aquela recaída e a segunda chance veio como um aviso de Deus para mim. Foram três meses intensos, de passeios (durante o pico da pandemia não havia sido possível), viagens, brincadeiras e muito, muito amor. Vivíamos tudo deixando que fluísse naturalmente, sem nos preocuparmos com o amanhã.
Jamais passou pela minha cabeça que seus dias de presença física, neste plano, estavam se encerrando. Fomos a um passeio e ele brincou muito.
“Passei a noite ao lado dele, segurando sua mão e falando durante toda a noite o quanto o amava, ele me respondia, “eu também mamãe”.”
No dia seguinte Fellipe não estava bem, levamos ao hospital, brincou no quarto como sempre fazia, porém, apresentava piora progressiva. Passei a noite ao lado dele, segurando sua mão e falando durante toda a noite o quanto o amava, ele me respondia, “eu também mamãe”.
Eu sentia suas forças indo embora, a angústia era imensa, mas minhas forças eram renovadas a todo instante. Precisou ser transferido para a UTI, fiquei ao lado dele, sem contato físico e em muita oração, e a noite ele partiu, voltou para os braços do papai do céu. Sou grata a Deus por ter permitido me despedir dele.
Eu não entendo o porquê, mas ele me foi dado para uma existência de 04 anos e 08 meses, metade desse tempo em busca da cura, e ele venceu, mesmo sendo criança. Aceitou seu tratamento, mesmo sem entender o porquê, aceitou, mesmo sem saber, cumpriu a parte dele muito bem.
Sou grata a Deus por ter permitido me despedir do meu filho.
“Sinto sempre sua presença. Gosto muito de falar sobre ele, apesar de nem sempre ter uma pessoa receptiva a ouvir.”
Fellipe partiu em 04/01/22 e cada dia é uma superação. Sinto sempre sua presença. Gosto muito de falar sobre ele, me sinto bem o mantendo vivo em minha memória, é como se ele estivesse mais próximo de mim, apesar de nem sempre ter uma pessoa receptiva a ouvir.
“O vazio fica. Agora somos só eu, o papai e a saudade, nada o substituirá, mas sigo na esperança de Deus me abençoar novamente.”
A saudade é constante, mas me sinto mais fortalecida a cada dia, sou mãe de um guerreiro forte e aprendi muito com ele. O vazio fica. Agora somos só eu, o papai e a saudade. A falta de cuidar permanece, nada o substituirá, mas sigo na esperança de Deus me abençoar novamente, se for da vontade D’ele, seguindo minha vida, até o nosso reencontro em outro plano.
Meu filho único, um grande amor, um grande aprendizado!
@erickacoliver01
@lacoselutos_